quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Invisibilidade

o poder da invisibilidade
é o que me falta,

uma fuga da realidade
que me mata

com a pouca verdade
de sua pureza casta

sobre minha felicidade
hoje já gasta.

Essa menina é um caso sério

Com o tempo contra nós
Não há muito o que fazer.
Nunca tive fé em muita coisa,
Mas hoje peço para que os céus me deem trégua,
Estou cansado dos corações partidos pelo caminho
Estou cansado de meu coração explodir a cada nova paixão.

Há uns olhos negros
Que me olham destemidos
Quase desafiadores,
Reprimidos por um gesto de qualquer atenção.

Livro-me dos pensamentos!
Não há nada além do que eu vejo
E se eu não te vejo
É como se você não existisse.

Será tudo mesmo real?
Me imagino em sonhos
Que poderiam substituir toda minha vida.
E se eu simplesmente desaparecesse
Que mal faria?

Acho tudo engraçado.
É impossível não achar!
Ó Deus!
Suas brincadeiras são as melhores!

Quando minhas mãos se estendem
Não buscam muita coisa,
Quero apenas as suas
Como em uma conectividade,
Uma troca de sensações,
Quero que sinta o meu coração bater
Por meus dedos
Por meu corpo todo...

Essa sua complexidade é o que mais me fascina.
Acaba com o marasmo do mundo,
Me arranca do ponto comum,
Faz com que eu perca horas
Imaginando qualquer besteira.
Essa sua complexidade de menina
Não-normal,
Corta com faca cega todo meu mal.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Tarde cinza

Como é bela a tarde cinza,
Chuvosa,
Um tanto fria
E silenciosa.

Na rede o sono vem
Entre as linhas do primeiro capítulo de um livro.
E Gabriel García Márquez que me perdoe,
Pois dormi com Cem anos de solidão sobre meu peito.

Nessa tarde nebulosa
Nem os cachorros latem,
Alguns se escondem em vãos de escadas,
Daqui vejo uns outros que dormem.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Futuro numa caixinha

Guardo o futuro
Em uma caixinha,
Local que não há mais seguro
Escondida pequenininha
Sob o travesseiro amassado
Onde repouso descansado
Em uma tardinha,
A tendo em pensamento,
Pois com nada mais me contento
E nada mais me inebria
Do que passar todo um dia
Tentando te arrancar do vento
Que me traz seu perfume.

Escadas

por cada esquina
de beco em beco
em toda rua
há uma escada


umas que sobem
umas que descem
sempre há gente
em qualquer escada


vão por vários caminhos
dando rumo a vida
trajetória de volta
rumo só de ida

Escute-me poeta

Muito fácil me auto-intitular poeta,
Muito fácil fazer versos.
O díficil desse ofício
É fazer alguém mostrar agrado.

Engraçado é ver uns e outros se gabarem de poucos versos
Tão fracos, meus deuses.
Admito minha falta de talento,
Em nenhum momento disse de mim tal grandioso,
Obstinado poeta...
E nem mais um tanto do que isso.

Rio escandalosamente ao saber que agora tem uma fonte,
Uma inspiração vinda sabe lá de onde
Uma musa, pra ser mais exato!
Ah! Criança!
Não se iluda,
Essa que pensas ser sua musa
De muitos já foi.
Isso com que a quer presentear
Já há tantos por aí,
Que não há como contar!

Escute-me poeta,
Desista enquanto é cedo,
Toque sua boiada a frente
Como eu já tenho feito.

Peça rara

Veio assim de mansinho
Como quem não queria nada,
Com um sorriso bonitinho
E a face envergonhada,
Livre dos cachos curtos
De madeixas cortadas,
Que aos poucos levo em furto
Como pequenas peças raras
Escondidas em meu olhar,
Livres que qualquer um
Que tente as roubar.

sábado, 25 de setembro de 2010

À base de pílulas

Quando durmo,
Quando acordo,
Em horários certos,
De seis em seis,
de oito em oito horas,
Só hoje já foram três;
Um anti-alérgico
Um anti-térmico
E um anti-viral.

Estou doente,
Preciso delas.
Não que seja um vício
Algo constante,
Apesar de ter um certo apreço por elas...
Mas é necessário.
São elas que me mantém em pé no momento em que escrevo isto,
São elas que não me deixam derrubar
Por uma gripe qualquer
Que veio de longe só pra me pegar.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Giramundo

Um passo pro lado
Esquecendo o passado.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Menina do samba

Das raízes do samba
Menina que roda
Na roda do tempo
Sua saia rendada.
Os pés já descalços,
Cansados, mas ainda intactos
Pela leveza com que dança
Quase flutuando.

Seus pés deixam o chão,
Seus braços envolvem um outro corpo
Que a levanta em movimentos sincronizados.

O chão molhado
Das bebidas ao redor,
Dos que aplaudem no ritmo da música
E se deixam levar pelo ré menor da canção
Dedilhado brilhantemente em um violão
Que emudece todo sinal de vida
E cala toda percussão
E paralisa todos os presentes
Que a veem sair delicadamente
Nos últimos passos de pernas trançadas
Abaixando procurando as sandálias
E sorrindo dentro do copo que a entregam
A chamando de menina do samba.

Sonhos cortados em janela de ônibus

Deixo os olhos fechados,
Atacados pela luz
Do sol da primavera.

O céu sem nuvens
E a pressa da vida
Correndo adoidada
Pelas veias dos corpos do homem.

O pouco tempo,
A falta de amor,
O beijo perdido,
Os olhos da menina que não posso ver,
O medo da perda,
A dor da saudade,
Os clichês poéticos,
A minha paixão.

De setembro, metade já foi.
Desse dia, ainda é manhã
E já volto pra casa
Com o vento na cara,
Rachando os lábios,
Secos e sem vida,
Sedentos por seu beijo
Que me despertariam desse sono de sonhos cortados
Na janela do ônibus.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Sono cortado por um cigarro

Uma fumaça de cigarro não me deixa dormir.
Não, não é meu cigarro.
A fumaça dos meus cigarros não me incomodam
E isso tem certa graça.

A fumaça dos meus cigarros são como nuvens de algodão,
São doces
Com efeitos de oculares maçãs.

Amanhã deveria acordar cedo,
Mas não durmo.
Parte pela fumaça
Parte por medo de fechar os olhos
E não a encontrar em meus sonhos.

Me odeie, my love!

Seria bom sentir seu ódio sobre mim,
Saber que nutre uma raiva interior
Desejando-me a morte!

Que recaia sobre mim todo o mal que causei.
Me odeie, my love!
Hate me with all your guts
Scream at me with pain
E me diga "vem, que te quero bem"
Com os olhos vermelhos de lágrimas
Choradas a noite toda
E agora escassas.

Esse meu fim,
Foi eu quem quis,
Now, let me just dry your tears
Before I say goodbye.

Paráfrase

Esse poema me veio após a leitura do texto "Silêncio da madrugada", de Icaro Simões.
Sem a devida permissão me veio a inspiração.

No silêncio da madrugada
Escondo-me sob o escuro do mundo.
Não há palmeiras cortadas ao vento,
Mas há cachorros que latem com medo
De uns passos mais apressados
De quem vem chegando atrasado.

Há quem grite com o filme da TV,
Mas não há desespero,
Apenas umas risadas do vizinho gordo
Que se faz ouvir até o final da rua.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Sendo criança

Papel, linha,
Vidro, cola,
Pedra, bola,
Volta da escola,
Tênis, mochila,
Corações, meninas,
Segredos, desejos,
Borboletas tão lindas,
Cores, odores,
Amores, Dolores
A moça da cantina,
Tão gorda e tão boa.

Vou sendo criança
Sem medo e sem dor.
Você é lembrança
Do mais puro amor
E de pobres rimas
Como essa acima
Que tanto ilumina
Minha inspiração.

A flor

Ela está ali,
Única,
Em um patamar a cima de qualquer coisa.
Ela é uma flor!
Sim, meus caros, uma flor!
Mas, mais que uma flor
Ela é uma amiga,
Uma confidente,
Quase um santuário
Onde deposito meus segredos
Com a certeza de que estarão guardados,
Sob suas pétalas
Que mudam de cor a qualquer nova mudança
A metamoformoseando nas mais variadas formas de ser.

"Michelle ma belle"

Carros passam,
A noite cai,
Os corpos correm
Apressados no fim da tarde,
Mas nada ofusca
Esse brilho que emana do fundo dos seus olhos
Quando qualquer palavra mais bonita é dita.

O mundo inteiro para!
Nada mais que passa é visto,
Pois nada mais importa.
Apenas uns versos de uma canção que me vem a mente.
"Michelle ma belle
Sont les mots qui vont tres bien ensemble"


As noites são muito curtas
E se vão tão rápido!
Quero abraços eternos,
Em meio a carinhos tenros,
Sob a luz de postes meio apagados
Encondidos em qualquer espaço
Onde nada seja ouvido
E o mundo não chegue,
Um lugar além
Além do que é real,
Para que lá possamos nos entregar
À loucura que nos invade o coração.

domingo, 19 de setembro de 2010

O parque da praça

Um carro vermelho,
Crianças sorridentes,
Palhaços que correm em círculos,
Atacados por multidões de pequenos corpos
Barulhentos,
Espremidos pelos brinquedos espalhados pela praça.

Sorri com a visão daquilo tudo,
Nos instantes que fiquei parado
Admirado como ainda há felicidade
Nos olhos destas crianças.

Continuei meu caminho rumo ao supermercado
Quase atropelado por um pequeno grupo
Que com um "licença aí, tio"
Correu até onde está o prato cheio de alegrias
Devorado pela multidão,
Que se alimentará daquilo tudo
E os encherá o coração .

Rimas quaisquer

Me senti na obrigação de fazer alguma rima de verdade,
Daquelas que trazem para os versos uma musicalidade
Digna de quem se auto-intitula um poeta.

Mas não sou bom com essas normas poéticas
De formas e obrigações estéticas.
Sou a favor da liberdade em qualquer instância,
Dos versos soltos, livres, tortos e sem cor
Como uma manifestação de uma infância
Sem o peso de uma responsabilidade maior.

Vidas passadas e futuras

Nada mais por aqui,
Só você.
E o mundo passa por nós
Numa velocidade que não o conseguimos acompanhar,
Então parado ficamos,
No que seria o fim da linha,
Apenas observando
O jogo de luzes surreais
Das almas que fogem aos corpos
Temerosas pela condenação eterna
Em um inferno que criamos
Para amedontrar as criancinhas
Que desobedeciam seus pais.

Não me contento em viver apenas uma vida,
É muito pouco o tempo que temos aqui.
Quero mais desse mundo!
Quero mais de cada parte dessa natureza,
Vasta, infinita!

sábado, 18 de setembro de 2010

Na madrugada eu sorrio

O mais surpreendente é acordar no meio da madrugada,
Quase manhã,
Ainda sobre o efeito ébrio de doses infinitas que quaisquer bebidas,
Nem abrir os olhos
E sorrir com a visão de uma imagem tão bela que recheia meus pensamentos.
A visão de seus olhos
Tímidos e sorridentes,
Fugindo aos meus,
Temerosos de entregarem seus segredos.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Notícias de um sonho

Sonhei que meus braços eram tentáculos
E que todos meus amigos eram pequenos pedaços
De recortes de jornais antigos,
Daqueles que ficam guardados em caixas de papelão
No sóton ou no porão
Ou na laje suja entre restos de construção.

As notícias que eu os lia
Eram de um tempo que eu nem sabia
Que existiu.

Pelas várias portas de minha mente
Me invadiam pensamentos oblíquos,
Sobre ela que me olhava de longe,
Meio cabisbaixa,
Escondida por trás da estante
Esperando que eu a buscasse.
E assim o fiz.

Ao estar frente à ela,
Nada podia dizer,
Nem me mexer eu podia.
Era uma sensação nova.
Meu olhar a cobria
Por inteiro.

Por horas eu poderia ficar ali,
Apenas a olhando,
Esperando talvez algum gesto tenro,
Um abraço demorado
Que me tornasse parte dela.

Não me lembro muito mais,
Apenas que gentilmente a beijei
E puxado pela luz do dia que nascia
E invadia o quarto em que dormia,
Acordei.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Eterna infância

Em uma breve conversa com Deus,
Lembrei dos meus desejos ocultos da eterna infância.
(Desejos não mais tão ocultos agora)
Não me entenda a mal,
Não queria ser como o Peter Pan,
Sempre em um corpo infantil
E com uma roupa um tanto quanto ridícula, convenhamos.

Meu espírito é de uma criança
Perdida nesse mundo feroz de adultos nocivos,
Correndo de um lado para o outro
Atrás de um esconderijo seguro.

Breve conversa com Deus

Sim Deus, eu tenho!
Tenho essa vontade de ser grande!
Tenho desejos infantis de morar em um circo
E passar a vida toda jogando bolas para cima
Tão sutilmente
Como nenhum malabarista jamais ousou fazer.

Oh! Deus,
Em sua santidade zomba de nós, não?
Sei que somos falhos,
Fracos
E inconsequentes,
Mas há tanta gente que ainda acredita veementemente
Em uma solução por sua parte.

No sétimo dia também quero um descanso,
Um descanso para a alma,
Cansada das tragédias do mundo.

Pequena vergonha

Espero pacientemente pela vergonha que me causará.
Imagino-me vermelho,
Frente às suas palavras
Contra atacado com minhas prórpias armas
Que tão sabiamente sei usar,
Para te arrancar um olhar perdido
Com os olhos escondidos
De mim.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Repartida

Te escrevo nessas linhas.
Isso mesmo, te escrevo,
Te risco nesses versos,
Repartindo em cada palavra
Um pouco de você.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Um sorriso que me veio enquanto pensava na saudade que eu sentia

Diante do mar,
Imprevisto um sorriso,
Que invisto em descontento
Um debate de sentimentos
Em improvisos de uma chuva
Inesperada e sem juízo,
Saiu tão convencido
De uma felicidade sem sentido.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Aos amigos e amores

Caros amigos,
Venho por meio deste
Atestar a minha loucura.
Perdi a noção da verdade,
Do que é o certo,
Do que é o mundo
E minha realidade.

Hoje me encontrei sorrindo
Coberto de frio,
Sem roupa alguma
Sob minha cama empoeirada,
Cantando canções inventadas
Na própria madrugada.

Cortei os pulsos
E continuei a cantar.
Ah! Como era linda a ópera que fiz!
Tão dramática.
Com certeza arrancou lágrimas
Da minha platéia imaginária.

Todos os meus amores estavam na primeira fila.
Todos eles!
Assistindo de camarote minha destruição,
Sentiam o gosto do meu sangue,
Que misturava-se às lágrimas furtivas
Delas que não agüentavam me ver daquele jeito
E despiam-se como uma última tentativa de me salvar,
Com seus corpos expostos
E mãos sobre mim
Sobrepostas às línguas
Que me arrancavam o gozo.
Como era lindo...
E sujo, tal ato!
Entreguei meu corpo e minha vida
A elas que devoravam cada pedaço meu,
Moribundo,
Estirado e estraçalhado,
Louco!
Sim, louco, meus deuses!
Como pude sucumbir à loucura?
E é tão bela,
Tão deliciosa loucura pecaminosa.

Tão entregue eu já estou,
Mas ainda me lembro de agradecer
A todas elas,
Por terem me mostrado o amor.
E antes que me esqueça,
Foi com um tiro na cabeça
Que minha mente se calou.

Estou vivo

Pensamento! Peço que se cale
Ou te meto uma bala!
À merda com o que tenta me fazer acreditar,
À merda com tudo o que me fez fazer,
À merda!

Me sinto vivo!
Tenho chorado,
Tenho amado,
Tenho sentido meu coração apertado,
Acelerado,
Despedaçado
E entregue a diferentes mãos.

Me sinto homem!
Pro inferno com os pudores do mundo!
Me sinto homem
E extasiado!

O sangue pulsa
Nos músculos intumescidos,
Vibrantes,
Sob as carnes lascivas
De um fogo vivo,
Delirante.

Morte na esquina

Cantem em conjunto a sinfonia
De nossa vida.

Vamos todos!
Cantem à bala que corta o peito de um alguém
E um coração de um ninguém
Que chora sobre o resto de vida
Soprada e levada aos céus.

Vamos todos!
Corram à praça pública,
Enforquem o responsável,
Gritem pela justiça
Que não está presente
E chorem!
Chorem como as nuvens em dias de inverno
Um choro frio
E morto.

Último poema

Não é bom escrever sobre ela.
Deixe-a lá, onde quer que esteja,
Isolada, para que a esqueça.

Ainda não durmo nas noites.
Temo em fechar os olhos
E encontrá-la em algum sonho.

Deixo agora aqui um último poema,
E deixo claro que será o ultimo,
Pois sei que não possuo mais o direito sobre sua imagem,
Sobre sua beleza,
Sobre um corpo que não é mais meu.

Ah! Minha garota!
Sou apenas uma criança!
Não devia ter depositado em mim tanta confiança...

Peço que vá em paz,
Mas que guarde-me um pouco,
O pouco de bom que tirou de mim.

O mal que é o amor

Sozinho sorrio sofrendo
Somente por ser tão ingênuo
Em achar que Deus não tenha sido irônico
Ao criar sentimento maldito
Que corrói o homem por dentro
E o mata pouco a pouco.

Queria poder acreditar em final feliz,
Queria poder sorrir.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Domingo no Rio Vermelho

Ruídos das mais diferentes formas
Inebriam-me o ouvido.
Os motores dos carros que passam
Em alta velocidade,
Cortados pelas ondas que quebram
À beira-mar,
Encobrindo o canto dos pássaros que fogem
Da realidade,
Por sobre os telhados que cobrem
O santo altar.

As cores se misturam por aqui.
O azul do céu sem nuvens,
O verde-mar cuspindo o branco espumante das ondas,
O cinza quente do concreto construído
E o marrom de umas árvores com poucas folhas que me rodeiam.

Tem um movimento repetitivo de passos de lá pra cá,
Um movimento devagar
De corpos que se arrastam sob o sol de domingo,
Suados,
Torcendo para uma nuvem qualquer ofuscar
Por um segundo que seja,
Esse brilho incandescente do sol que, certeiro,
Teme em queimar
O Rio Vermelho.

Discretamente perfeita

Me vejo deitado,
Escondido sob uns papéis
De poemas antigos
Meio rasgados
De tanto que os aperto contra mim,
Tentando arrancar deles
Sua boca,
Seus cabelos,
Seu corpo
Tão perfeitamente descritos,
Tão discretamente perfeitos.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O que já era de se esperar

Preso no sofá,
A televisão está desligada
Esperando dar o horário do programa preferido.
Vendo as sombras que passam nas paredes,
Imaginando diálogos entre elas,
Criando amizades através delas,
Amando quem não existe agora,
Levantando a mão
E pedindo esmola
Pronto para ir embora,
Sem saber que quem me espera lá fora
Trouxe-me um copo de cachaça,
Uma camisinha usada
E todo o amor que pode sentir
Junto com um cigarro que iremos dividir
Depois do êxtase numa cama de solteiro,
Numa casa sem chuveiro,
Quente, suja, mas que serve para mim.

De todos os livros que exibo na estante,
Mais da metade são apenas um toque estético para quem quiser olhar,
Gosto é mesmo de romance,
Daqueles mais fajutos,
E fico puto se alguém vem tentar me consertar
Dizendo o que é o certo,
O que eu deveria ler ou escutar.

Agora sento aqui sozinho
À espera de alguém que venha me resgatar.
Sinto falta de uma voz em meu ouvido
Dizendo que sempre vai me amar.
Olho então para cima
Esperando que o céu me jogue uma pedra na cabeça,
Pois assim acabará com todo esse sofrimento
E rapidamente fará com que o mundo todo se esqueça
Do que aconteceu aqui,
Do menino que andando na rua desapareceu
Consumido por uma luz que diziam ser de Deus.

Toda noite penso
Que poderia estar aqui alguém que eu possa abraçar,
Lembro então dos velhos dias
Quando eu era querido
E não faltava ninguém nesse lugar.
Lembro de quando não dormia só,
Das noites regadas a cigarros, alcool
E o seu maldito pó.
Dos muitos que aqui passavam
E que não os conhecíamos,
Mas sempre os arranjávamos um espaço pra ficar.

Gravei algumas vezes sua risada
E de vez em quando as ouço baixo como se ainda risse para mim.
Assim eu rio junto infantil,
Choro lágrimas alegres
De uma tristeza que nunca antes se viu.
Corro então ladeira abaixo,
Grito alto,
Voo baixo
Para tentar te encontrar.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Tarde pré-primavera

Eu te vejo
E eu te peço um pouco mais de tempo
E um beijo no meu rosto
Em qualquer momento,
Sob o sol que queima,
Sol de quase setembro
Quase primavera,
Sol de qualquer lugar
Qualquer espera.

Procura-se uma menininha

Seus dentes não são mais de leite,
Não posso mais jogá-la nas costas,
Nem comprá-la com doces.
Hoje fala comigo como se fosse uma adulta.
Onde está aquela criancinha que peguei no colo?
E cansado de correr atrás,
Dormia primeiro quando devia te fazer dormir.

Um brinde à longevidade

Só mais uma coisa,
Que não pude te dizer
Na carta que te mandei
Naquele verão de trinta e três.
Eu estava apaixonado
Pela garota de pele branca,
Cabelos negros
E olhos grandes,
E que hoje anos depois,
Com a pele queimada pelo tempo,
Os cabelos já brancos
E os olhos cansados
Ainda é você quem me faz sorrir
Todas as noites
Depois do boa noite,
Igual desde sempre,
Mas que nunca canso de ouvir.