sábado, 27 de março de 2010

Carta a um amigo

"Nada de novo no front"
Sem maiores novidades,
A vida vai boa por aqui,
Tudo corre bem,
Seguindo seu rumo.
As crianças ainda não vieram,
Mas espero em breve a chegada de alguma
E faço questão da sua visita,
Seu posto de padrinho está garantido.
A Adriana passa bem,
Está feliz.

E por aí?
Como vai o trabalho?
Sei que anda bastante ocupado.
É um dos grandões agora, não?
Mas pelo visto ainda mantém o mesmo coração,
Do tempo de criança,
Dos dias que corríamos pelo gosto de correr.
Eramos tão livres!

É bom saber de você,
Saber que está bem,
E o mais importante
Que está feliz.

Bom, me despeço com um forte abraço
E o desejo da maior felicidade que possa ter.
É bom saber que ainda tenho um amigo verdadeiro.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Um jornal de hoje, por favor.

Um jornal de hoje, por favor.
Veja só, não entendo esse negócio de dólar,
Um dia sobe,
No outro desce,
Dizem que influencia a nossa economia,
Mas sempre vejo tudo mais caro no mercado,
Seja na alta ou na baixa desse dólar.

Essa parte de economia eu nem leio,
Vai para ficar no canto,
Na cama do cachorro.
Classificados...
Gosto de ver os preços das casas que nunca terei.
Esporte...
Se me perguntarem a escalação do meu time,
Não sei se acerto nem quem é o técnico.
O mundo anda mesmo perigoso, não?
Mais atentados,
Carros bomba,
Exércitos invasores,
Assassinatos...
Enfim, essa parte guardo para mais tarde.

Ei, me vê aquela revista ali.
A capa me parece interessante,
Fala sobre o assassinato do cartunista,
O daime.
Sabe que depois disso tudo me deu uma tremenda vontade de tomar esse daime?
Acho que não só em mim.
Não, não vou levar,
Vou dar uma olhada aqui mesmo.
Uma folheada, leitura dinâmica,
Uma olhada nas figuras,
Pronto!

Olhem aquelas crianças,
Mais ou menos doze anos,
Tentando comprar a mais nova playboy,
E um maço de cigarros,
Que provavelmente fumarão dois,
Não aguentarão e o resto vai para o lixo.
Falar em cigarro, tenho poucos.
Me vê uma carteira de Carlton, seu Raimundo.
E um isqueiro que o meu eu perdi,
Ou roubaram, não sei.
Aquela noitada de ontem acabou comigo.

Se incomoda d'eu fumar?
Ah! As palavras cruzadas!
Resolvo umas três que já estavam na cara e guardo o jornal.
Essa fumaça,
Esse outono,
Esse clima frio,
Essa Nova York dos anos 20,
Essa minha mente poluída por pensamentos eróticos com as moças de minissaia,
E pela fumaça do ar frio do outono.

Lembro que preciso passar na farmácia,
Acabou o descongestionante
E com esse tempo o nariz teme em falhar a noite.
E essa copa do mundo?
Será que o Brasil ganha, seu Raimundo?
Uma torrencial de pensamentos futebolísticos,
Dos quais entendo pouco mais de um terço,
É jogada sobre mim.
Táticas, escalações, formações, substitutos...
Ouça a tudo,
Pensando em nada.
Volto o pensamento as moças de minissaias,
Volto o pensamento a farmácia que logo fechará,
E ao trem que terei de pegar,
A essa hora não mais tão cheio,
Certeza de que sentarei,
Ao lado de um estranho qualquer,
Que não me interessará da onde vem e para onde vai.

Antes de ir pego o guia da TV,
Procuro entre os canais algo que seja útil assistir,
Alguns filmes repetidos,
Programas aleatórios sobre assuntos não tão interessantes,
É, acho que a TV só me servirá como fonte de luz essa noite.
Tomarei uma sopa,
Depois um café,
Um cigarro,
Farei as palavras cruzadas e dormirei por sobre o jornal.

Olho para o relógio,
Dou um rápido adeus a seu Raimundo
E desço correndo a escadaria do plataforma,
Em pouco virá o trem para casa.

Um copo de café e uma aspirina, por favor.

Um copo de café e uma aspirina, por favor.
Que se explodam comigo todos os comigos de mim,
(com o perdão de Pessoa)
Sente-se senhora, o seu chá virá em um instante,
Já se passaram das cinco horas,
O chá atrasou!
Onde está sua pontualidade britânica, Sir?
Torradas para acompanhar o chá?
Temos os mais deliciosos patês!
Ah! Coisa chata esses britânicos,
E os americanos!
Gosto mesmo dos depressivos,
Eles sim sabem viver a vida!
Ou não...

Onde está a minha aspirina?
A essa altura o café esfriou.
Não, ainda está morno,
Mas está sem açucar!
Quem em sã consciência me traz um café sem açucar?
É um ultraje!
Quero falar com o gerente!

Menina bonita a do caixa,
Percebi que me olhou umas duas vezes,
Tenho que mudar de lugar,
Minha vermelhidão envergonhada já transpassa minha pele negra.

Como está vazio isso hoje!
Realmente o serviço não é mais o mesmo de anos atrás.
Quando dessa terra provinham pessoas educadas,
Com caráter!
Ah! Sim! Agora chegou minha aspirina!
Por incrível que pareça a cabeça não mais dói.
Mas tomo a aspirina por preucação.

Oh! Deus!
Oh! Nietszche!
Quero forças,
Quero sucos de laranja com gelo,
Quero forcas para os insolentes,
Quero filosofias milenares!
Quero entender Kant!
Quero uma explicação consisa e precisa do porquê de aceitar Jesus!
Até agora não tive nada,
Até agora só uma aspirina e um café.

Penso em um pedaço de torta,
A vi no balcão,
Parecia apetitosa.
Mas está acima do que posso gastar
E não sei se conseguirei comê-la sozinho,
Preciso de alguém com quem dividir.
Pena que meus amigos ficaram no passado,
Em outro lugar,
Em outra vida,
Em outro eu.

A senhora do chá com torradas já foi.
Puxando seu cachorro pela coleira.
Um cachorro feio por assim dizer,
Um tanto desgostoso por estar naquela situação, creio eu.
Soltou-se da coleira e correu atrás de um gato que passou,
Desesperada, em gritos ela o chamava "Munford! Volte aqui menino!"
Acho que o pobre cachorro nunca havia se sentido tão vivo.

Ri daquela situação,
Percebi que a menina do balcão também ria
E olhava para mim,
Como que se esperando algum comentário.
Baixei os olhos.
Voltei ao fundo da minha xícara.

Ainda quero aquele suco de laranja!
Vejo que a menina do balcão se aproxima,
Suo.
Não quero mais café, obrigado.
Mas um suco de laranja seria bom, por favor.
Com gelo.

Já passam das seis,
O trem para casa a essa hora não é muito convidativo,
Mas há outras coisas a serem feitas.

Olhe aqueles dois homens ali,
Colegas de trabalho talvez,
Vestem-se como quem tem trabalho importante,
Com suas pastas de couro do lado,
Papéis e mais papéis devem se perder ali dentro,
Grandes contratos,
Milionários talvez,
Entre grandes empresas,
Talvez do ramo imobiliário.
É o ramo que mais cresce por aqui.
Eles sim são importantes!
São os homens que movimentam o mundo.
E o que eu faço?
Escrevo sobre esses homens,
Conto suas histórias,
Leio suas mentes e crio seus mundos no papel.
Toda minha vida é um grande passatempo,
Uma brincadeira infantil.
Mas não pense que lamento,
Sou feliz com isso,
Não aguentaria o peso de ter a responsabilidade de movimentar o mundo.

Enquanto isso continuo na minha brincadeira.
Pago meu café e meu suco,
A menina do balcão me dá outra aspirina.
"Em caso da dor voltar"
Sorrio um sorriso verdadeiro para ela,
Pego meu troco e saio.

quarta-feira, 24 de março de 2010

O que seria do mundo no fim do mundo?

Mas e se o mundo acabasse agora?
O que seria daquele sorvete que não tomei?
Chocolate com cobertura de caramelo...
E toda aquela carne que não comi?
Faria diferença?
Não teria salvo o mundo.

Todos os beijos que eu dei,
De nada me serviriam agora.
Todo o sexo,
Hoje não mais importaria.
E todas aquelas noites que passei acordado?
Sejam elas em festas ou mesmo com insônia.
Os dias sonolentos que passei após elas também não fariam diferença.

Seriam mesmo os dias felizes esquecidos?
Os sorrisos seriam apagados para sempre?
As meninas. Ah! As meninas!
Elas também não fariam mais diferença.

Mas e o sorvete?
Realmente me preocupo com ele.
E constantemente me pergunto,
O que seria do mundo no fim do mundo?

terça-feira, 23 de março de 2010

De onde vem?

E essa loucura que me aflige, de onde vem?
De onde vem essa flor que me cobre?
De onde vem esse vento que me encolhe?
E essa chuva torrencial, de onde vem?

De onde vem esse sonho que me faz sorrir?
E esse olhar que me persegue, de onde vem?
E essa escuridão dessa manhã, de onde vem?
De onde vem essas palavras que sopram em meu ouvido?

E esse seu jeito de mal-me-quer, de onde vem?
De onde vem esse seu instinto?
E essa sua forma de me amar meio estranha, de onde vem?
De onde vem esse brilho dos seus olhos?

De onde vem essa sua vontade de se jogar em minha cama?
De onde vem esse seu desejo incontrolável de derrubar as minhas coisas?
E essa sua fraqueza após todo o prazer, de onde vem?
E esse som de despertador, de onde vem?

sexta-feira, 12 de março de 2010

Palavras para descrever meus dias (todos iguais)

Subdesenvolvimento de minha mente
Mente a cada momento sobre o que sente
Anti-heroísmo conformado
Sou o que corre
O fraco

Hifenização dos meus compostos
Gramatização da minha língua
Mais derivação desses tais verbos
E a continuação da pouca vida

Meninas com seus cabelos lisos
Dançam levemente e tão lindas
E temem em me olhar nos olhos
Como se soubessem o que eu penso

Pelos cantos esquecidos com minha gente
Entorpecendo a alma com a natureza
Vendo de longe as meninas que dançam
Santos meus! Que beleza!

Desfilando pelo ar que me rodeia
Deslizando pelos morros empoeirados
Seguindo por atalhos escondidos
E chegar ao ponto de espera
Para então voltar a casa
Que me guarda pela noite
E no próximo dia me desagua.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Dancem homens!

Dancem homens fracos,
Com seus corações bons.
Dancem suas valsas,
Desritmados.
Dancem sob o céu de poucas nuvens
E muito estrelado.
Dancem homens,
Dancem seu bailado.
Dancem até não haver mais chão sob seus pés.
Vamos, continuem!
Sigam os passos solitários,
Enterrados em seus quartos,
Trancados.

Dancem homens!

Imaginações de uma tarde de segunda

Quando não há nada para fazer,
Eu imagino.
Imagino formas e cores
De seios e flores.

E assim viajo.
Vou longe,
Tão longe que esqueço de onde parti.
Perco o caminho de volta ao meu mundo.

E agora? O que eu faço?
Como desembaraço
Essa linha do tempo e espaço?
Que me enrola em espasmos contínuos,
Dos músculos endurecidos,
Com a visão do corpo todo de seu rosto
Ao alcance de meus dedos.

Manhã-noite

Acordei com pingos na testa,
Chovia como nunca lá fora.
Os pingos eram coordenados,
“Um, dois, três, pingo”. Pensava.

Era uma manhã como noite,
Com nuvens da noite,
E o silêncio da noite.
Ouvia os passos molhados de quem passava,
Lembrava que hoje não sairia de casa
E agradecia.

Fiquei levando pingos na testa por bastante tempo,
Não me incomodava com eles,
Secava o rosto a cada um e esperava o próximo.
“Um, dois, três, pingo”. Ainda pensava.

Devagar a chuva foi parando,
Os pingos não estavam mais no ritmo,
Agora bailavam com suas próprias vontades,
Ora chegando até minha testa,
Ora se perdendo pelo caminho.

Esquentava.

A manhã-noite dava suas caras de dia,
O céu se abriu em alguns pontos.
Já passavam das onze horas
E o sol apontava como se estivesse acabando de nascer.

O lençol se perdeu,
O suor escorreu
Pelo pescoço até o peito nu.
Engraçado como o calor em poucos minutos leva todo o frio que aqui estava e todas as rajadas de vento que aqui passavam.

Idéia perdida durante a noite


Levantei-me no escuro,
Tateei a bancada,
Procurei um pedaço de papel e uma caneta,
Tinha algo estupendo a escrever!

Ceguei-me rapidamente com a luz que acendi,
Voltei minha atenção ao papel e ao pensamento,
Era incrível o que pensara,
A maior de minhas idéias.

A caneta tremia em meus dedos,
Ainda ressonava,
Bocejava,
Apertava os olhos numa tentativa desesperada em acordar por completo,
E num desses apertos
Tudo o que pensara, sumiu.
Toda aquela idéia brilhante fugiu.
Olhava inerte para o pedaço de papel,
Este mesmo pedaço de papel.

Quem sabe voltando a dormir,
Em outro sonho a idéia volte a mim!